segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Conversa na praia


O rapaz avistou a moça sentada nas areias da praia deserta naquela noite de lua crescente. Aproximou-se para pedir um cigarro.

- Eu não fumo. – respondeu a moça sem sorrir, mas com os olhos mais brilhantes que já vira.

- Preciso largar o cigarro. – comentou o rapaz se assentando ao lado da moça. – É um vício cruel.

- Sou viciada em cafeína. – disse ela abrindo a embalagem de uma bala de café.

- Odeio café. – falou ele.

Ela riu, pela primeira vez ele percebeu o sorriso alvo da moça.

- Os meus avós tinham uma fazenda de café em São Paulo. Íamos muito lá até que parte foi tomada pelo MST. – lembrou a moça com nostalgia.

- Essa gente pensa que tem o rei na barriga. Como acham que podem tomar as terras alheias como se fossem bolinhas de gude? – o rapaz parecia bravo.

- Eles não são má gente. Ocuparam a parte improdutiva da fazenda. Só querem um pouco de terra, todos temos direito, aliás.

- Você não pode estar falando sério! – ele zombou. – Que discurso comunista!

- Tenho inclinação para o socialismo, mas não me envolvo muito. – ela disse e tirou a bala da boca, enrolou-a no papel.

- Vai jogar fora? – perguntou o rapaz.

- Sim. Tenho mania de chupar a bala sem mastigá-la. – explicou e guardou o papel na bolsa.

- Que desperdício!

- Esperdício! – corrigiu a moça.

- O quê? – ele pareceu não entender.

- Você disse desperdício. Na verdade, é esperdício. – repetiu calmamente.

- Ora, não me corrija, sou jornalista.

- E eu sou estudante de letras. Tenho um dicionário na minha bolsa.

O moço riu:

- Você anda com um dicionário na bolsa? Não é um tanto estranho?

- Estranho é você que chega me pedindo cigarro. Eu poderia ser uma assassina.

- Você não tem cara de assassina.

A moça sorriu e olhou a palavra no dicionário.

- Acho que discutimos á toa. Cabe tanto esperdício como desperdício.

E os dois riram. Continuaram a conversa. Perceberam que em muitas coisas discordavam. Ela era amante das poesias e ele não entendia os versos. Ele gostava de balada e ela gostava da solidão do cais. Ele lia livros de auto-ajuda e ela repelia esse tipo de leitura. Ela queria ir pra China, ele queria conhecer os Estados Unidos. Ela queria ter quatro filhos e casar na fazenda, ele não pensava em se casar. Ela ouvia MPB, ele gostava de rock. Por fim, riram de tanta discordância e das demais coisas que nem imaginavam discordar. Antes de se despedirem, passaram um tempo em silêncio vendo a lua sobre o mar e a enseada ao longe. Concordaram que a lua estava esplêndida, o mar era vasto e profundo como o ser humano, as areias eram infinitas como os sonhos e que não havia nada mais curioso e divino do que o relacionamento. Assim, se despediram e cada um seguiu seu próprio caminho.

37 comentários:

Bárbara Matias disse...

Gostei mto do fim.
Eles segiram seu próprio caminho....


Estou super fazendo propaganda do seu blog... viu??

Vc vai ver qdo chegar aqui...rs

bjos,

Da leitora-fã...(rs)

Maria Eduarda disse...

Eu sonho em encontrar alguém assim todos os dias, mas é meio impossivel, já que o meu mundo étão real e alguem que me pedisse um cigarro só obteria um eu não tenho comomresposta e fim de papo...
Gostei demais do seu texto, ;D
:*

Unknown disse...

É, e cada um teve uma leve participação na própria história. Uma conversa bestinha, tornando-se legal... E depois? Nada mais que descordâncias.

Gostei do texto.

Abraço, Sr. Dono de Sofisma!

=]

Renato Ziggy disse...

Meu Deus, mas você está ficando cada vez melhor! Eu AMEI esse texto! A cada discordância, eu dava uma risada do lado de cá, meio que me identificando com a conversa deles, em que vez ou outra um faz o papel de "do contra". Rolou uma lutinha leve de egos ali, mas isso tornou o texto muito divertido e envolvente. Confesso que queria ter estado lá, na frente deles, ouvindo a conversa. O problema é que eu ia disparar a rir e os dois iam querer me linchar (hahaha! é assim que se escreve isso?).

Meu, mandou MUITO bem! Parabéns! E só não te dei selos também, porque você os ganhou pelo Vicente. Fica pra próxima, amigo!

Zy

Clara Mazini disse...

Eu gosto da concordância. Sei lá, é preciso saber falar a mesma língua, né?

Anônimo disse...

Ai, ai... Lindo, meigo, singelo... TUdo isso!
Adorei!

:: Daniel :: disse...

Eu também gostei muito do final, nega completamente o velho clichê dos "opostos se atraem".

Muito embora eu confesse: adoraria começar um grande amor em cima de discordâncias. Concordar sempre com tudo é muito chato... =]

Texto de uma sutileza digna de aplausos! Parabéns!

Abraço,
Daniel

Fernando Locke disse...

Great! mas, puxa...pensei que iam ficar juntos no final! eh, as coisas nem sempre são como a gente imagina, mas está de parabéns!

Mafê Probst disse...

Achei que o caminho deles terminaria sendo trilhado juntos.

Unknown disse...

sim, a vida tem dessas coisa

ou melhor

a vida é exatamente isso

Tata - A Moderninha disse...

Muito legal!!!!

Em pensar q pessoas estranhas falam com pessoas diferentes que são estranhas mais talvez não tão diferentes de nós!!!

Gostei muito do texto...

Vida q segue..rs

beijo grande

Renato Ziggy disse...

Tem selo te aguardando em meu blog. Abraço!

Renato Ziggy disse...

Lipão, sem dúvidas, sempre que escrevo tenho um dicionário para me auxiliar, pois aparecem palavras na minha cabeça, mas às vezes não sei se o sentido delas tem a ver com o que eu gostaria de passar. Por isso confiro pra ver se tá tudo certo. Agora, procurar palavras no dicionário pra usar nos textos, isso não faço não. Busco usar palavras novas que venho aprendendo (recurso de memorização) e deixar que minha memória corporal traga as palavras que eu posso dizer. Abraço!

Unknown disse...

Ah, como essas conversas discordantes me fazem falta...
Adorei!
Bjo,
Ana

Anônimo disse...

ameiii o texto!! acho que não é pq a pessoa tem gostos diferente dos seus que devemos ignora-las

é interessante conversar, analisar ponto de vista diferentes, experiência que vc nunca pensou em ter..

isso sim é viver em comunhão e respeitar o proximo

beijossssssssss

Anônimo disse...

Dizem existir pessoas cometas e pessoas estrelas não?
Cometas apenas passam.
Estrelas estão sempre lá a brilhar.
De certa forma eu discordo com as frases acima, pois não é por acaso que uma pessoasentra na nossa vida e também não é por acaso que ela fica ou sai.


Linda a mensagem do SEU texto:)

beijos

A Maya disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
A Maya disse...

Gostei muito do texto, e, se me permite, acrescentei seu endereço nos meus links para poder estar sempre por aqui.
Parabéns.

Fernando Locke disse...

pow cara, fiz uma homenagem lá nomeu blog, distrubuindo selos,mas inferlizmente (para mim) vc já tem todos os selos que eutenho, daí naum pude lhe passar nenhumnovo.

Camila disse...

Há mais nas diferenças que no mais comum-dos-lugares... viva!!!

beijos daqui...

Alberto Vieira disse...

Cara...to cada dia mais encantado com sua facilidade de escrever textos assim tao bons!

VC consegue fazer agente imaginar a cena e estar dentro dela ouvido os dialogos!!


Um grande abraço

Clareana Arôxa disse...

para mim, uma das melhores coisas que o homem faz é se descobrir aos poucos.
é tão bom conversar, tão bom viver.


e sim, o silêncio fala tanta coisa!

beijo, moço!

Jaya Magalhães disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Jaya Magalhães disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Ana Paula Vieira disse...

oie!
adorei seu espaço aki e seu texto eh mto fofo tb, vo te colokar nos meus links para naum te perder d vista
ahauhauah
Bjs

Pushoverboy disse...

Cara me identifiquei muito com o texto... sabe, é claro que eu gosto de estar com quem tem os meus gostos mas eu adoro as diferenças... pouca gente entende que não é preciso concordância para haver entendimento... pelo menos em algumas coisas.
Abraço

Anônimo disse...

Cara, gostei muito!
O final não é clichê e o texto foi bem suave.

Parabéns.
___

Tem algo lá no ótica que é de seu interesse.

Abraço.

J.S. disse...

Adoro desacordos...rs...geralmente sou 'do-contra'!!!! mas em uma coisa tenho q concordar...ADORO seus textos!!!
ah...tenho uns selinhos pra vc!!!
um beijo, moço!

Unknown disse...

Acho que eles foram espertos seguindo seus caminhos.

Se divertiram com suas discordâncias no início, mas num relacionamento todo ao contrário... sei não, acho probemático.

Mas quem vai saber?

Critical Watcher disse...

Lipe...
Por que sempre você me faz sentir assim? Como se o seu texto nunca acabasse. Como se ele ficasse impregnado por semanas a fio... Eu sou apaixonado pela sua forma de escrever. Muito bom mesmo!
Parabéns, meu fí!
Abraços.

Anônimo disse...

Não sou adepta ao ditado que "os opostos se atraem". Acho que isso ocorre com menos frequência. Penso isso por experiência própria. Estar ao lado de alguém que não tem nada a ver com você, é algo constrangedor. Mas se há amor, as coisas mudam né...

Lindo texto, também amei esse fim. Fiquei na expectativa dos dois ficarem juntos, mas confesso que prefiro os finais em aberto e os finais digamos que, não-comuns.

Fernanda Papandrea disse...

Esses encontros são tão lindos!
às vezes é bom que sejam apenas um encontro,pra termos aquela lembrança imauculada.

gostei muitíssimo!

beijos

banzooo disse...

Adorei teus textos, pelo jeito compensa passar sempre por aqui. Vou linkar teu blog no meu, certo?!
Parabéns! :)

[Ana Clara]

pp1993 disse...

achei o fim muito interessante, bem como todo a temática do texto.
muito,muito bom!
beijos.

Anônimo disse...

Simplismente Perfeito.

=)

Tem paixão no que você escreve, moço.

beejo

Nando Damázio disse...

Filipe, lendo seus contos, dá sempre vontade de ler mais .. E acho incrível sua habilidade, coisa de escritor pronto, formado !! Minha literatura pop-juvenil é farelo perto disso aqui, hehehe .. Qualidade primorosa mesmo !!

A casualidade de um simples encontro informal revelou a essas duas pessoas algo totalmente novo, proporcionou novas descobertas e inúmeras possibilidade .. Entre essas possibilidades, eles optaram por seguir cada qual o seu caminho .. No começo achei que eles seriam tipo o casal "Eduardo e Mônica" da música, terminando juntos, e acho que qualquer autor gostaria que o final fosse assim .. Porém os personagens decidiram por si próprios seus destinos, desafiaram a vontade do autor e fizeram o que bem entenderam, pois quem cria os personagens é o autor, mas quem sabe da vida deles são eles próprios !!

Não sou pretensioso para te dar "parabéns", mas que isso aqui é bom demais, isso é !!
Abraço !!

o Cronista disse...

ahhhhhhhh!
eu vivia com um dicionario comigo!
ajuda pra caramba!
e é melhor que um cigarro!