Naquele pós-carnaval, as ruas estavam em serpentina e confete, simbolizando uma tristeza conseqüente de uma cidade que viveu dias de alegria desmedida. Alguns cães latiam ao longe, uns pássaros ciscavam na calçada imunda de cores, uma senhora abria a janela pra ver o movimento. De repente, você. Quebrava a esquina em pernas desequilibradas. Não de bebedeira. Você nunca foi de beber. Desequilíbrio vindo de uma saudade que aprisionava suas pernas, querendo atrasar um reencontro já marcado.
Eu sorri enternecido. Não esperava você daquele jeito. Minhas expectativas eram você chegando em um sábado à tarde, entulhada de malas, trazendo um sorriso de felicidade condenada e uns olhos entornados de amor. Mas você vinha trocando os passos, segurando uma máscara na mão esquerda e, nos lábios, uma marchinha.
A bolsinha do Waldemar,
Dá pra desconfiar,
A bolsinha do Waldemar,
Dá pra desconfiar.
Me pegou pelas mãos e me levou até o meio da rua deserta. O abraço trazia um desejo de prolongar a eternidade por mais dois tempos. A saudade que havia em mim era tal qual uma mesa de madeira
- Eu voltei. – você anunciou, desfazendo o abraço e me olhando, sem jeito.
- Hoje é quarta-feira de cinzas. – foram as minhas palavras.
- Cinzas de um amor passado, você quer dizer.
- Não. Cinzas de uma saudade incandescente. Incontrolável. – expliquei.
- Nunca gostamos de carnaval. – você, evasiva.
- Ironia. – eu ri de nervoso.
- Sabe por que eu vim hoje? – e você se voltou, inteira.
- Pra dizer que vai partir novamente. – minhas teorias, sempre tão pessimistas.
- Pra levar você. Pra tirar de mim esse esperar contínuo.
- Eu vou. – sorri, sem saber como ia.
- Agora?
E eu beijei uns lábios trêmulos de quem se surpreendeu com a resposta. Depois, segurei suas mãos e fomos juntos em silêncio.
Enquanto segurava sua mão, ri de uma idéia que me ocorreu: partir e estar são situações separadas por uma margem tão tênue que, naquele instante, eu não sabia se partia com você ou se estava com você. Depois me veio um lampejo esclarecedor. Eu sempre estive. Você sempre esteve.
E apertei mais forte seus dedos.