terça-feira, 25 de agosto de 2015

Desalmar

As pessoas não estão habituadas ao amor. Isso não é mais novidade. Românticos, idealistas, sonhadores são todos parte de uma classe em extinção. A classe que ora surge – e esta me preocupa – é aquela que deprecia o amor. Que faz chacota das declarações românticas, que faz piada com o sentimentalismo, que desacredita dos gestos afáveis (porque são piegas demais). Desconfio dessa gente, dessa classe que perdeu os bons adjetivos, que não sabe encantar o parceiro, que se horroriza com as ‘tolices’ dos apaixonados. Desconfio dessa gente que prefere o óbvio ao papelzinho deixado em cima da mesa do café, com a declaração de amor que faz o dia nascer feliz. Temo a falta da ternura, a falta de fé, a falta de gentileza, a falta das serestas, dos poemas rimados, das cartas com juras de amor. Temo a vergonha que se tem do amor de Cazuza – aquele com mil rosas roubadas. Se a regra agora é amar discretamente, linearmente, silenciosamente, desconfio que o instituidor dessa lei nunca soube, de fato, o que é amor. Porque amor mesmo não cabe apertado no peito. Não cabe em lugar nenhum.

sábado, 20 de junho de 2015

Tardes insones.


Já não ligo mais pras horas.

Meu relógio faz movimento inverso.

Regrido.

Amanheço.

E quando adormeço, meu coração ancora.

Meu peito enternece, minha cortina esvoaça.

Lentamente eu puxo a coberta.

O frio me esquenta a alma.

E a coisa que eu mais gosto é encostar meus pés gelados.

Em você.

Talvez eu devesse tomar mais uma aspirina.

A mente embaralha os movimentos da luz torta.

Essa que entra através da cortina que esvoaça.

No espelho, a reprodução da minha tez espessa.

Da minha solidão imensa.

É o retrato do licor que já bebi, em amargura.

Soluçando os verbos que me saem bêbados.

Enquanto eu encaro sua nudez afoita.

Seus olhos cerradinhos. 

Seus cabelos espalhados despropositadamente.

No meu travesseiro.

Você conhece muito bem o meu vazio.

E preenche com martini –

Que eu nunca tomei, mas parece uma bebida sofisticada.

Eu te olho de relance.

Você é tudo aquilo que eu queria.

Nas minhas tardes insones.