Veio você com esse olhar de despedida e, na face, um tormento que, sem sucesso, tentava esconder. Abraçou-me. Eu senti sua garganta embargada e ouvi sua foz fraquinha balbuciar um “adeus” no meu ouvido. Apertou-me contra o peito e os corações uniram-se numa nota só, num lirismo inquietante que se pôs a pulsar sem controle.
- As estrelas. – você me disse, assim, com a voz cheia de candura.
- O que tem as estrelas?
- Será minha forma de visitá-lo todas as noites.
E ficamos num silêncio impróprio, você cantando pra mim, dizendo que meu perfume ia ficar como presente daquele último encontro. Lembrou-se do nosso pé de amora e da nossa brincadeira de sujar o nariz um do outro com a fruta. Rimos da sua mãe desconfiadíssima de um possível namoro entre nós dois. E o primeiro beijo, iniciativa sua, dado dentro do banheiro masculino.
- Cante uma canção pra mim. – você pede com um tom irrecusável.
- Eu não canto bem.
- Não ligo. Quero a sua voz ressoando no meu ouvido quando eu entrar no avião.
E eu cantei qualquer coisa que você adorou. Seus olhos tão miudinhos se encheram dágua e a despedida nunca doeu tanto como naquele momento. E rimos. Rimos da cena e daquela vontade implícita de jogar tudo pro alto e ir morar na lua, eu e você com nossos doze filhos e as doze babás. Sonhar ao seu lado tinha um quê de brincadeira, era como pegar um lápis colorido e sair pintando a felicidade. Interessante a forma como eu sabia amar você.
- Eu já vou. – e você se soltou de mim, pegou uma mala e me apontou a outra.
- A gente se fala? – eu perguntei e você sorriu.
- Você tem meu telefone.
E fomos de mãos dadas, eu já pensando em um pedido de casamento ali, naquele momento. O coração inquieto, a tristeza de imaginar o porvir, a certeza de que as poesias não seriam mais as mesmas. É que sua leitura pausada despertava todos os meus prazeres e causava-me sensações alucinógenas que pareciam não ter fim. E os seus dedos, passeando pelos meus cabelos, me despertavam pra singeleza dos seus atos tão inesquecíveis.
- Quer vir comigo? – suas brincadeiras sempre foram de mau gosto.
- Eu fico aqui olhando você voar.
- Se mudar de idéia, você me alcança. Sei das suas asas.
E o último aceno foi como quando você me cumprimentou pela primeira vez. Meu estômago borbulhava. É a forma como eu sabia amar você.