Lembro-me bem dos cachecóis enroscados em seu pescoço nos dias frios. Sua afinidade com o inverno se esvaía quando chegava a estação. Tom de tristeza, você dizia. As ruas ficavam mais cinzas, o vento abraçava, cortando, como quem vem trazendo qualquer angústia pro coração. E aquele canteiro com poucas flores era o resquício de primavera das estações passadas ou prelúdio daquela que ainda estava por vir. É que a tristeza emendava na alegria. E quando as flores danavam a se abrir, não havia quem as segurasse.
Mas o inverno era cenário de conversas nossas na varanda. Leite quente na caneca pousada na mesa, a fumaça fazendo desenhos indecorosos dos quais a gente ia rindo. Piadas inúmeras que rasgavam o céu da boca e expeliam lágrimas sabe-se lá de quê. E vinha o esfregar de mãos, o arrepio no corpo todo, a sensação térmica que nos impelia para a cama, debaixo dos cobertores felpudos. Ao mesmo tempo, a vontade de prolongar a conversa e adiar o deleite no travesseiro.
Quando tagarelávamos sobre assuntos da infância, o cenário se fazia nostálgico e as lágrimas agora eram outras. A gente se lembrava do colégio, da época em que namorar era vergonha; menino tinha que ser amigo de menino e pronto e acabou. No fundo, todos queriam mesmo era namorar a Alicinha, linda de morrer. A Bete, coitada, gorda com seus óculos fundo de garrafa, era alvo de chacota; os meninos puxavam-lhe os cabelos em trança e ela gritava os mil palavrões que aprendia com o pai general. Alicinha casou-se com um muçulmano linha dura, enfurnou-se em uma burca, hoje vive triste em sua beleza. Bete encontrou a alegria nos livros, emagreceu e foi trabalhar em uma embaixada num desses países de primeiro mundo.
Do primeiro beijo, ríamos da falta de jeito, da mão direita que enlaçava com cuidado a cintura da moça e da outra mão que não se sabia onde colocar. Os lábios eufóricos, a saliva descontrolada, as línguas que não se encontravam porque ficavam tímidas demais ou salientes demais. E tudo parecia mágica, a consagração da adolescência, mundo das descobertas e dos perigos. A conversa com os pais sobre sexo e droga, os olhares desconfiados da mãe, a rebeldia desmedida.
Inverno traz lembrança e vontade de ficar mais perto. O frio que faz a pele precisar de calor, traz também a necessidade do contato, do abraço mais demorado. O frio é que permite o cheiro ficar nas mãos. Vamos voltar pra dentro de casa, está muito gelado aqui. E vou lhe confessar uma coisa: a Bete sempre me chamou mais a atenção.
Mas o inverno era cenário de conversas nossas na varanda. Leite quente na caneca pousada na mesa, a fumaça fazendo desenhos indecorosos dos quais a gente ia rindo. Piadas inúmeras que rasgavam o céu da boca e expeliam lágrimas sabe-se lá de quê. E vinha o esfregar de mãos, o arrepio no corpo todo, a sensação térmica que nos impelia para a cama, debaixo dos cobertores felpudos. Ao mesmo tempo, a vontade de prolongar a conversa e adiar o deleite no travesseiro.
Quando tagarelávamos sobre assuntos da infância, o cenário se fazia nostálgico e as lágrimas agora eram outras. A gente se lembrava do colégio, da época em que namorar era vergonha; menino tinha que ser amigo de menino e pronto e acabou. No fundo, todos queriam mesmo era namorar a Alicinha, linda de morrer. A Bete, coitada, gorda com seus óculos fundo de garrafa, era alvo de chacota; os meninos puxavam-lhe os cabelos em trança e ela gritava os mil palavrões que aprendia com o pai general. Alicinha casou-se com um muçulmano linha dura, enfurnou-se em uma burca, hoje vive triste em sua beleza. Bete encontrou a alegria nos livros, emagreceu e foi trabalhar em uma embaixada num desses países de primeiro mundo.
Do primeiro beijo, ríamos da falta de jeito, da mão direita que enlaçava com cuidado a cintura da moça e da outra mão que não se sabia onde colocar. Os lábios eufóricos, a saliva descontrolada, as línguas que não se encontravam porque ficavam tímidas demais ou salientes demais. E tudo parecia mágica, a consagração da adolescência, mundo das descobertas e dos perigos. A conversa com os pais sobre sexo e droga, os olhares desconfiados da mãe, a rebeldia desmedida.
Inverno traz lembrança e vontade de ficar mais perto. O frio que faz a pele precisar de calor, traz também a necessidade do contato, do abraço mais demorado. O frio é que permite o cheiro ficar nas mãos. Vamos voltar pra dentro de casa, está muito gelado aqui. E vou lhe confessar uma coisa: a Bete sempre me chamou mais a atenção.
17 comentários:
Filipe meu amigo, que texto suave. Gosto muito da tua escrita. Tu esmiuça com um tato espetacular detalhes tão sensíveis de histórias perfumadas, doces na maneira expressada.
Esse texto é mais uma obra-prima da sua sensibilidade extrema e de sua alma doce, que esbanja poesia.
Lindo, maravilhosamente perfeito.
:)
Abraço forte.
E boa semana aí mano.
o frio..me recordo bem que os melhores momentos da minha vida, passei no frio! Quase nunca queria voltar pra casa! Que lindo Filipe, eu falei com a Jaya, ela me disse o porquê de ter fechado lá.
Obrigado e um abraço.
Filipe, é agradável demais, demais ler os seus textos.
Eu não consigo fazer um comentário sequer sem que faça um elogio também! E, claro, os comentários parecem redundância até. Mas, francamente, eu adoro ler o que você escreve.
Adoro o frio. Adoro a necessidade de um abraço mais demorado, um beijo mais quente, uma conversa tranqüila. O frio é, pra mim, um tempo mais calmo. Não me traz tristeza não. A necessidade é que parece ficar mais aguçada. E isso é bom, muito bom!
Queria que hoje estivesse frio, graças as suas palavras.
Beijo, beijo!
Lindo lindo lindo!!!!
Nossa, como eu senti saudades daqui... O que deu em mim pra sumir dos blogs desse jeito, hein?
Em todo caso, valeu a pena voltar e me deparar com um texto desses...
Sabe, eu sou das que não gosta de frio, e sim desse calorzão que está fazendo lá foram. Mas quer saber? Agora deu até vontade de um friozinho e um colo...
Beijo
Por essas e outras que espero um dia abandonar o quente e cheio de firulas nordeste.
Embora tenha nascido num outono e com grandes lembranças de antigas primaveras, creio q o inverno torna-se minha estaçao predileta. Adoro chuva, vento, frio. Com alguem do meu lado o cenario eh perfeito.
Me senti como a flutuar ao ler o texto ...
Parece que via a cena se desenrolar ...
Bjs =*
Ótimo texto - final genial!
Deu para viver um pouco dessa história. E vou condessar uma coisa: sempre gostei de invernos.
Filipe,
É encantador a forma como você combina as palavras. Elas ficam tão mais bonitas. Seus textos me provovam uma leveza, uma torrente de devaneios que ficam guardadinhos aqui comigo. Gosto muito mesmo de te ler aqui, sempre.
E compartilho com você meu gosto pelo frio. Não vejo nele tom de tristeza. Em mim ele faz tudo ficar mais próximo. Elegante. Estação que eu aprecio muito. E é nela que tenho estórias e mais estórias pra contar.
Parabéns pelo texto. Eu fico, as vezes, quase sem palavras pra comentar, tamanha minha admiração.
Beeijo!
Cara, sem comentários para o seu texto.
Como um amante do inverno tenho q dizer que consigo contemplar a beleza do seu conto, quase que vivenciando-o.
Abção!
suavidade demaais :)
ameeeei xd
bejoo
Aqui, onde moro, não temos inverno. Não desses invernos de cachecóis enroscados que aconchegam, pelo menos. Mas me senti assim, aconchegada, com uma caneca de leite quentinho na mão, e conversas, e risadas, e tudo o mais que não conheço, mas que agora me foi tão claro e possível que não seria mentira de minha parte se dissesse que também estive aí.
Vc faz mágica.
Beijos, moço
você tem talento para escrever. eu adoro ler seus textos. parabens p vc!
beijos e tudo de bom
Verdade Filipe! Quando a gente ama pulsam várias estrelinhas dentro de nós. E sou eu quem quero ler um livro teu :)
Abraço.
Nada como o inverno pra esquentar um pouco os corpos...
Beijos!
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