terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Entardecer


Ao cair da tarde, se descobre que não importa quanta coisa se tem pra fazer, o dia vai dando seu adeus. E que independe se ainda é preciso salvar o mundo, o sol também tem direito a descanso e vai perdendo as forças, vestindo o céu de cores pálidas, num crepúsculo que prenuncia a hora das estrelas.


Ao entardecer, percebe-se que as janelas dos prédios vão se abrindo pro vento da noite, num convite esperançoso para que a lua adentre e se faça pintura na parede da sala. A vontade de quem debruça no parapeito, é entender o mistério que ronda toda essa façanha natural que nada mais é do que metáfora de nós mesmos.


A silhueta do satélite é como pingente nas nuvens, alertando, como um sino impertinente, que é hora de o corpo pedir repouso. Em réplica, os pés se arrastam na tentativa de ludibriar, querendo prolongar mais dois minutos de sóis. Os olhos, ao revés, vão procurando qualquer canto para poder estender as pernas, jogar os braços, fazendo deles ninho para a cabeça que já pende enfadada.


Os carros vão fazendo fila no asfalto e as pessoas, irritadas, não entendem por que a noite tem tanta pressa. As crianças vendem bala no sinal, denunciando a escuridão de uma vida que provoca um incômodo incandescente. Os grilos, tímidos à luz do dia, montam sua sinfonia, como se estivessem elegendo a estrela mais bonita. Os riscos rosados no céu lembram qualquer tela abstrata, provando que existem dedos maiores que inspiram os homens.


Ao cair da tarde, o mundo vai silenciando-se do barulho ensurdecedor que vem do ego. Os ânimos se fazem mais mansos e o sono toma as pálpebras, pedindo calma pro coração acelerado, sempre tão cheio de problemas. A mãe vem com a manta cobrir os pés dos filhos; e a família se encontra para mais uma oportunidade de se enxergarem, enfim. Os sonhos do dia seguinte vão se aproximando da mente que não para, sempre fazendo planos.


O entardecer é o jeito que Deus tem pra dizer que precisamos de ordem por dentro, quando o caos impera na luz ofuscante do dia.


10 comentários:

Carlos Pegurski disse...

Comentei lá, comento aqui. Surpreendente seu talento, Filipe. É muito maduro e consciente. Abraços.

Sueli Maia (Mai) disse...

Poeta, você pasma seu leitor.
Do caos, o cosmo. Sim, você disse tantas coisas aqui, Filipe. E filosofou, bonito e claro. E o amanhã é sempre uma hipótese que nos move. Porque se hoje o sol deita, amanhã (das poucas certezas) ele virá novamente. Beijos, @migo.
Saudades de ti.
Fica bem

Sueli Maia (Mai) disse...

E gostei das cores e gostei das tirinhas do template. Você está leve, solto. E lindo na imagem do perfil...(Bah...continuo fã descarada...risoss)

Luciana Brito disse...

O entardecer me encanta por tudo que contém e tuas palavras sobre ele fizeram ficar mais lindo do que já é.

Beijo, Lipe!

Ps. O layout ficou bonito demais. =)

Gabi Pasquale disse...

O entardecer é como se fosse a calma. A calma ou a turbulência de um dia que já se foi pra outro que ainda está por vir.
É o momento onde o sol fica mais bonito. E seu layout se remete a isso: ao entardecer sereno e bonito.

Parabéns pelos textos, sempre.

Amanda Oliveira disse...

Sem dúvida o entardecer é um modo de deixar a mente nos levar a lugares onde o dia não pode, sonhar.
Adoooro *___* 100 comentários.

Menina_Mulher disse...

Lindo, delicado e reflexivo!
Vc brinca com as palavras e faz o meu mundo um lugar melhor.

Beijos!

Anônimo disse...

Que seja de lua cheia. Porque os sonhos do dia seguinte precisam de companhia ao nascer e a inspiração é o sorriso quem me dá.

Maria disse...

[Assim, é que um elogio seu tem sempre um peso maior. Vem carregado da admiração que tenho por ti, sabe?]

...

Sempre vi no fim do dia, essa calma de Deus...essa prova de que somos tão pequeninos e precisamos tanto cuidar do nosso coração. Dar o repouso certo, a tranquilidade necessária... para acordar e viver algumas horas imperativamente até voltar à fragilidade de nós mesmos.

...

Meu beijo

Ana EmíliaYamashita disse...

Bom final.