sábado, 20 de junho de 2009

Benjamim II


Assim que Amélia saiu do meu escritório, pedi que Andréia, minha secretária, providenciasse um táxi. Eu seguiria Amélia até sua casa sem que ela soubesse. Não queria que ela esperasse por mim. Encontros esperados se tornam artificiais. Eu precisava das surpresas, das reações.


Pedi ao taxista que seguisse o veículo de Amélia e assim ele fez. Chegamos à residência onde havia acontecido o crime. Era uma casa singela, bem cuidada e pequena. Paguei o motorista e aguardei alguns minutos antes de tocar o interfone e chamar por Amélia que havia acabado de entrar.


Quem veio me receber no portão foi a própria, com um semblante de surpresa indescritível.


- Você não esperava por mim, não é? – perguntei.


- Você disse que viria amanhã. – ela choramingou como uma criança mimada.


- Eu menti. – disse e entrei pelo portão, adentrando no jardim principal da residência. Dei alguns passos e já estava dentro da casa. – Tem alguém aqui, com você?


- Sim, eu...


- Onde estão os policiais? – perguntei e ela gaguejou em resposta. – Você ainda não acionou a polícia?


- Não, eu...


- Muito bem. Não sei o que a senhora está querendo esconder, Dona Amélia. Seja o que for, descobrirei agora. Com licença. – disse e segui por um corredor à frente.


- Eu não estou escondendo nada! O senhor está muito enganado. – era Amélia, seguindo os meus passos.


- Qual era o quarto da sua mãe? – indaguei ao me voltar para ela.


- Aquele. – ela apontou e eu entrei. O quarto estava imerso em um odor acre, algo que misturava remédios, urina e cheiro de gente velha.


- Está limpo.


- Ninguém tocou em nada, eu posso garantir. – ela afirmou num tom de voz duvidoso.


- Não pode afirmar nada. Você não esteve em casa o dia todo. O quarto não estava trancado. Qualquer um poderia ter entrado aqui. – me aproximei da cabeceira da cama e puxei uma gaveta do criado-mudo posto ao lado. – Um vidro de remédio.


- Esse é um dos vários que ela tomava.


- Está vazio. – observei.


- E o que tem?


- Nada. – larguei o vidro na gaveta e a fechei. – Aqui não há nada interessante. Vamos para o outro quarto.


Voltamos ao corredor. Dessa vez, escolhi a porta da frente e abri.


- É o quarto da Carmem, minha irmã. Ela deve estar dormindo.


Lá dentro, estava o médico sentado na cama da paciente. Ao ouvir o barulho da porta se abrindo, deu um pulo, desconsertado.


- Esse é o Dr. Romeu. E aquela, na cama, é a Carmem. – disse Amélia que se mantinha logo atrás de mim. – Doutor, esse é o detetive Benjamim.


Troquei um aperto de mão com o médico e fitei seus olhos, por alguns instantes.


- O senhor é uma pessoa rara, doutor. – eu disse.


- Por que diz isso?


- Não devem ser muitas pessoas que têm a cor de um olho diferente da do outro.


Eu esperava uma explicação científica ou qualquer coisa plausível que me convencesse daquela anomalia, mas o doutor permaneceu calado. Apenas riu, simpaticamente. Ou idiotamente. Só então percebi Carmem, a irmã de Amélia. Era uma moça estática, paralisada na cama, sem se comunicar com o mundo. Tive pena.


- Onde estão seus instrumentos de trabalho, doutor? – perguntei.


- Não os trouxe. Exames de rotina, apenas. – ele disse, enfim.


- O senhor costuma se assentar na cama dos pacientes?


- Ora, eu estava apenas conversando com a Carmem. Sentei-me para ficar de frente para ela. – ele estava nervoso, como quem esconde um segredo.


- Certamente o senhor sabe da terrível morte da matriarca.


- Sim. Pobre Dona Ieda. Uma perda lastimável.


- Acredita que alguém possa ter exagerado na dose de algum remédio, provocando sua morte?


- É o que tudo indica. A enfermeira averiguou os medicamentos e observou que um deles estava com o frasco vazio, embora no dia anterior estivesse cheio.


- Acha que uma das enfermeiras pode ter feito isso?


- Eu não sei.


- O senhor matou sua paciente, doutor? – lancei a pergunta. Eu não queria resposta, queria reação. Uma simples reação e tudo viria à tona.


- Não, Benjamim, eu não matei Dona Ieda. – ele foi seguro, como não foi em nenhuma outra resposta.


Caminhei pelo quarto que não era muito grande. Parei de frente para a janela. Um ar fresco adentrava por ali. Passei a mão no parapeito e toquei em algo rígido e pequeno, muito pequeno. Encostei o objeto ao dedo e aproximei-o dos meus olhos. Era uma lente de contato que havia sido perdida por alguém. E seja quem fosse, a havia perdido há mais de horas, visto que estava enrijecida.


- A que horas o senhor chegou nesta casa hoje? – perguntei me dirigindo ao médico.


- Há pouco mais de vinte minutos.


- Esteve aqui ontem?


- Não, não estive. – ele afirmou.


Amélia se aproximou, notando minha atenção demasiada sobre a lente.


- O que você tem nas mãos, Benjamim?


- Nada, só um monte de poeira. Onde é a saída para os fundos? – disse e me retirei do cômodo pensando na mentira que o Doutor Romeu acabara de me contar.


... CONTINUA


10 comentários:

Anônimo disse...

Opa, opa!
Tá esquentando.

Será uma conspiração por herança?
Tenho minhas teorias.

Aguardando.
(leia meu comentário anterior, lá falo da coincidência incrível dos nossos textos).

Fernanda disse...

Sabe o que é ler Esse conto as 02:57 da manhã?! O.O
I R A D O!


tou esperando o resto!

Saudades guri! (L)

Sueli Maia (Mai) disse...

O detetive Benjamin está em meio a uma bela trama.
Que nos reservas, Filipe?
Deixa te falar que estou adorando este livro.
Mas sou aflita para ler e capítulos assim me fazem quase roer as unhas.
Andas escrevendo cada vez melhor.

beijos, querido.
Fica bem

C.L. disse...

Faz tempo que não ando no mundo dos meus queridos e agora, infelizmente, estou com pouco tempo. Você está escrevendo um livro pra gente?Porque eu não acompanhei - ainda - a história do começo, mas já estou curiosa pra saber o que vai acontecer!
Beijos, querido.

TIAGO JULIO MARTINS disse...

Valeu por me dar mais sentido, Filipe.

E li, gostei e tô esperando o desfecho.

gabi disse...

médico com um olho de cada cor... pensei logo na Terra dos Meninos Pelados;

...esperando...

/eomédicotemculpanocartório;

A Torre Mágica | Pedro Antônio de Oliveira disse...

Olá, Filipe!

É sempre bom receber sua visita e é ótimo estar por aqui acompanhando seus textos!

Ah, garoto! Você prende a atenção da gente com suas tramas! (rsrsrsrs)

Abração!

Pedro Antônio - A TORRE MÁGICA

C.L. disse...

Onde eu consegui aquele?Na loja!Voltaram a vender!
Aquele é meu e aquela é minha mãozinha!
hahahahaha
:)

Lucas Vallim disse...

Novamente, ótimo. Espero ancioso a continuação.

disse...

Nosssaaaaaa, o q vem agora???

Pensei numa coisinha aqui, me conta um segredo, só para mim: (vc já sabe o final desta história?? ;D)...rsrss

Continuo lendo-te...

Hj eu fico aqui imaginando o "como-será"...

Bjosss :**