Eu queria te
dizer que a vida é muito curta pra gente brincar de bem-me-quer-mal-me-quer.
Que, antes de buscar a certeza de qualquer sentimento, a gente tem que ter a
vontade de senti-lo, de tê-lo pulsando dentro do peito, ardente. Que antes da
meia-noite todo mundo se posa de maduro e sensato, mas ao encostar a cabeça no
travesseiro, todos os medos insistem em retomar a visita da noite anterior.
Eu queria te
dizer que eu nasci amando. Que eu só sei fazer isso: amar. E que eu não
acredito em amores diferentes: amor, pra mim, é igual em qualquer direção. Que
eu nunca te amei de verdade porque eu nunca li o amor nos seus olhos. A gente
não ama sem querer, como você já supôs em uma conversa de botequim. A gente ama
é no dia-a-dia, quando o som dos passos da outra pessoa, chegando devagarinho,
é capaz de beliscar qualquer ponto da alma, numa insensata alegria. A gente
descobre que ama quando não faz mais sentido viver sem. Os ares pedem aquela
pessoa, os risos são daquela pessoa, os pensamentos furtados, durante uma reunião
de negócios importante, são daquela pessoa. O amor é a certeza quase absurda de
que não é apenas o coração que chama pelo outro. É o corpo inteiro que funciona
como imã, zoom, capaz de buscar a
melhor resolução. Tudo se torna extremamente possível.
Eu queria dizer
que eu gostei de você, você gostou do João, que gostou da Amanda, que gosta do
José. Ninguém gostando reciprocamente de ninguém. E que vai ser sempre assim.
Porque a gente vai gostando até descobrir o dedinho torto do pé direito ou a
letra de garrancho ou a gagueira no momento de ansiedade. Gostar é pouco, é
rápido, é só simpatia. Das vezes que busquei um mar profundo em você, só
consegui colocar os pés na margem, deixando meu tornozelo enxuto e meus pés
tocando pedrinhas pontiagudas. Isso nunca foi suficiente. Talvez, por isso, eu
não tenha insistido em suas profundezas e, talvez pela minha timidez em ir
fundo você tenha se aberto pouco. Eu só queria te dizer que não gosto desses
jogos. Eu nunca sei jogar e, quando faço isso, sem saber, sempre derrubo as
peças do tabuleiro.
Eu só queria que
você soubesse que eu procurei um sorriso que não desbotasse, um abraço que não
me largasse, um gesto macio que me fizesse querer escrever poemas de madrugada
e decorar as letras de música que falassem de nós dois. E que, a tardinha,
quando o sol viesse se pôr na nossa janela, eu pudesse te buscar para tomar um
chá gelado e, segurando suas mãos, dizer que meus compromissos todos seriam
você.
Eu só queria que
você soubesse que você me devolveu a liberdade. E que você, um dia, me
encontrará na fila do cinema sem a menor pretensão de ser seu. De te fazer ser
minha. Porque o amor, infelizmente, não aconteceu pra nós.
3 comentários:
E assim a vida segue uns momentos com mais inspiração que outros.
E suas palavras sempre me abraçando, me fazendo ver as coisas de um jeito diferente, mais bonito.
Beijos em você!
É muito lindo como você usa cada palavra.Seus textos cada dia melhores!*!
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