...você tem que me fazer um juramento
De só ter um pensamento
Ser só minha até morrer...
(Vinicius de Moraes e Carlos Lyra)
Se você quer ser minha namorada, precisa saber que eu não durmo com a luz acesa e que acordo ranzinza com qualquer iluminação atingindo abruptamente o meu rosto. Mas que eu acordarei contente se meu sono for interrompido por constantes beijos seus em efeito cascata. Precisa saber também que eu costumo acordar de mal-humor e será bem possível que, apesar dos beijos, eu resmungue qualquer coisa, embora por dentro eu esteja imensamente satisfeito.
Se você quer ser minha namorada, precisa saber que eu serei um velho reclamão. Que eu tenho o péssimo hábito de ser metódico e querer as coisas em seus devidos lugares. Mas que eu sairei do meu eixo quando você apontar na soleira da porta enquanto eu estiver lendo Grande Sertão: Veredas, me iscando para qualquer programa a dois. Não será difícil eu me render a duas palavras suas depois de um afago e de algumas promessas. Aquelas bregas, de amor.
Se você quer ser minha namorada, deve saber que sou indeciso. Encontro todas as variáveis possíveis e até as impossíveis. Prefiro o certo a arriscar. Talvez você pense que isso nos fará ter uma vidinha monótona, mas eu prometo ser imprevisível quando você estiver desprevenida. Chegarei com duas passagens de avião para Ravena e uma proposta em um papel timbrado com minha caligrafia trêmula.
Se você quer ser minha namorada, há de entender meu gosto pelo silêncio e a desnecessidade de briguinhas por ciúmes. Mas se aparecer um cara de gestos e palavras impróprias, querendo levar você para longe de mim, eu buscarei força na minha vontade de ser lutador de judô e despejarei nele qualquer coisa parecida com um aviso bem dado. Não serei louco. Serei inteiro de você.
Se você quer ser minha namorada, terá de ser amiga quando meus rancores se esvaírem em lágrimas de dor. Seu colo será meu divã terapêutico e suas palavras como remédio. Sugiro que você cante Toquinho nesse momento, daqueles sambas que fazem meus pés ganharem vida própria e quererem caminhos novos. Caminhos de perdão. E que você não ria depois, me contando como sou feio enquanto choro, imitando minhas caretas. Isso me irrita e eu te beliscaria até você ficar toda roxa. E então eu te beijaria até a dor aliviar.
Se você quer ser minha namorada, precisa entender minha timidez e minha preferência por passeios reservados. Que eu terei vergonha do seu pai, por mais agradável que ele seja; e dos seus irmãos também. Mas para você eu me abrirei aos poucos, e você me folheará em leitura diária, descobrindo tantas outras coisas que nem eu mesmo sabia. Depois, deitaremos lado a lado, com os rostos em contato, respirando o sorriso demente que nos escapará dos lábios. Falaremos de futuro, de filhos e eu a abraçarei inteira, num prenúncio de amor.